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sábado, 14 de maio de 2011

8º Encontro - Produção e oralidade

Post gaiolas e asas

GAIOLAS E ASAS
Rubem Alves
Os pensamentos me chegam de forma inesperada, sob a forma de aforismos. Fico feliz porque sei que Lichtenberg, William Blake e Nietzsche frequentemente eram também atacados por eles. Digo “atacados” porque eles surgem repentinamente, sem preparo, com a força de um raio. Aforismos são visões: fazem ver, sem explicar. Pois ontem, de repente, esse aforismo me atacou: “Há escolas que são gaiolas. Há escolas que são asas”.
Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do vôo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-las para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o vôo.
Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são os pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.
Esse simples aforismo nasceu de um sofrimento: sofri conversando com professoras de segundo grau, em escolas de periferia. O que elas contam são relatos de horror e medo. Balbúrdia, gritaria, desrespeito, ofensas, ameaças… E elas, timidamente, pedindo silêncio, tentando fazer as coisas que a burocracia determina que sejam feitas, como dar o programa, fazer avaliações… Ouvindo os seus relatos, vi uma jaula cheia de tigres famintos, dentes arreganhados, garras à mostra – e a domadoras com seus chicotes, fazendo ameaças fracas demais para a força dos tigres.
Sentir alegria ao sair de casa para ir à escola? Ter prazer em ensinar? Amar os alunos? O sonho é livrar-se de tudo aquilo. Mas não podem. A porta de ferro que fecha os tigres é a mesma porta que as fecha com os tigres.
Nos tempos de minha infância, eu tinha um prazer cruel: pegar passarinhos. Fazia minhas próprias arapucas, punha fubá dentro e ficava escondido, esperando… O pobre passarinho vinha, atraído pelo fubá. Ia comendo, entrava na arapuca e pisava no poleiro. E era uma vez um passarinho voante. Cuidadosamente eu enfiava a mão na arapuca, pegava o passarinho e o colocava dentro de uma gaiola. O pássaro se lançava furiosamente contra os arames, batia as asas, crispava as garras e enfiava o bico entre os vãos. Na inútil tentativa de ganhar de novo o espaço, ficava ensanguentado… Sempre me lembro com tristeza da minha crueldade infantil.
Violento, o pássaro que luta contra os arames da gaiola? Ou violenta será a imóvel gaiola que o prende? Violentos, os adolescentes de periferia? Ou serão as escolas que são violentas? As escolas serão gaiolas? Vão me falar sobre a necessidade das escolas dizendo que os adolescentes de periferia precisam ser educados para melhorarem de vida. De acordo. É preciso que os adolescentes, que todos, tenham uma boa educação. Uma boa educação abre os caminhos de uma vida melhor. Mas eu pergunto: nossas escolas estão dando uma boa educação? O que é uma boa educação?
O que os burocratas pressupõe sem pensar é que os alunos ganham uma boa educação se aprendem os conteúdos dos programas oficiais. E, para testar a qualidade da educação, criam mecanismos, provas e avaliações, acrescidos dos novos exames elaborados pelo Ministério da Educação.
Mas será mesmo? Será que a aprendizagem dos programas oficiais se identifica com o ideal de uma boa educação? Você sabe o que é “dígrafo”? E os usos da partícula “se”? E o nome das enzimas que entram na digestão? E o sujeito da frase “Ouviram do Ipiranga as margens plácidas de um povo heróico o brado retumbante”? Qual a utilidade da palavra “mesóclise”? Pobres professoras, também engaioladas… São obrigadas a ensinar o que os programas mandam, sabendo que é inútil. Isso é hábito velho das escolas. Bruno Bettelheim relata sua experiência com as escolas: “Fui forçado (!) a estudar o que os professores haviam decidido que eu deveria aprender. E aprender à sua maneira”.
O sujeito da educação é o corpo, porque é nele que está a vida. É o corpo que quer aprender para poder viver. É ele que dá as ordens. A inteligência é um instrumento do corpo cuja função é ajudá-lo a viver. Nietzsche dizia que ela, a inteligência, era “ferramenta” e “brinquedo” do corpo. Nisso se resume o programa educacional do corpo: aprender “ferramentas”, aprender “brinquedos”.
“Ferramentas” são conhecimentos que nos permitem resolver os problemas vitais do dia-a-dia. “Brinquedos” são todas aquelas coisas que, não tendo nenhuma utilidade como ferramentas, dão prazer e alegria à alma.
Nessas duas palavras, ferramentas e brinquedos, está o resumo da educação. Ferramentas e brinquedos não são gaiolas. São asas. Ferramentas me permitem voar pelos caminhos do mundo.
Brinquedos me permitem voar pelos caminhos da alma. Quem está aprendendo ferramentas e brinquedos está aprendendo liberdade, não fica violento. Fica alegre, vendo as asas crescer… Assim todo professor, ao ensinar, teria de se perguntar: “Isso que vou ensinar, é ferramenta? É brinquedo?” Se não for, é melhor deixar de lado.
As estatísticas oficiais anunciam o aumento das escolas e o aumento dos alunos matriculados. Esses dados não me dizem nada. Não me dizem se são gaiolas ou asas. Mas eu sei que há professores que amam o vôo dos seus alunos.
Há esperança…


Disponível em:
http://michelechristine.wordpress.com/2010/11/15/rubem-alves-gaiolas-e-asas/







Repentistas e Literatura de cordel


Os Repentistas

O que são os "Repentistas"? Uma dupla que improvisa (o "repente"), sobre os mais variados temas, ao som de uma música extremamente simples -quase monótona- tocada em violões ou violas, que -invariavelmente- denotam um uso excessivo.
Enquanto um toca o vilão ou a viola, o outro improvisa. Ao final de um verso de geralmente seis a dez linhas, o outro começa a improvisar e quem estava cantando passa a tocar. Os turistas viram "doutor" e "doutora", e são objeto de comentários produzidos pela prodigiosa imaginação dos repentistas; os melhores garantem uns dez minutos de gargalhadas, tanta sua criatividade. 
O repentista em geral fixa seu preço -dependendo do número de pessoas na barraca- cantando, ao fim do seu show. Um casal pode dar, por uns minutos de show, algo entre R$ 5,00 e R$ 10.00 para a dupla. Grupos maiores chegam a dar R$ 10,00 para cada repentista. Depende de quanto você desfrutou o show.



Abordagem
O repentista não pede autorização para começar seu show; aproxima-se da barraca e começa cantar. Ao fazê-lo apontará ao integrante da platéia ao qual se referem seus comentários e dirá algo elogiando alguma qualidade, real ou suposta, do turista. 
Se você não quiser o "serviço" simplesmente faça um gesto indicando que não deseja ouvi-los e se retirarão sem qualquer problema. Mas pelo menos uma vez faça a experiência (geralmente são todos muito bons, mas para não arriscar ouça-os primeiros numa barraca vizinha e depois chame-os). 
Se tiver câmera de vídeo, filme-os. Vai adorar mostrar aos seus amigos os comentários que a dupla fez sobre você e seus acompanhantes.




Com a palavra, um repentista
"Sou repentista e, como tal, gostaria de parabenizá-los pelo interesse de falar sobre a nossa atividade.
Lamento, no entanto, que as informações não estejam nem um pouco abrangentes como deveriam, pois os repentistas de quem falam são apenas uma pequena parcela que canta nas praias do Nordeste. Foi omitido, portanto, o papel digno e profissional dos vários cantadores que se apresentam em cantorias, em grandes Festivais de Repentistas do Brasil e que por muitas vezes já representaram o nosso país em países como: Portugal, França, Espanha, Alemanha e Estados Unidos. esses cantadores a que me refiro representam "aí sim" a cantoria do Nordeste com a manutenção de suas características. Os nossos colegas, que por uma questão de mercado, trabalham nas praias, infelizmente têm a sua dignidade maculada pela situação a que são expostos. Quanto aos instrumentos que usam é outra distorsão da realidade, visto que o instrumento mais caracteriza a cantoria é a "viola" e não violão, como foi citado e mostrado em foto.
Gostaria, portanto, que fosse feita essa correção no sentido de deixar claro que as informações passadas não correspondem à realidade da categoria como um todo. e sim de uma pequena parcela.
Cordialmente,
Edmilson Ferreira
Recife
Pernambuco"

Disponível em:



Poesia em Cordel

Literatura de cordel é um tipo de poema popular, originalmente oral, e depois impressa em folhetos rústicos ou outra qualidade de papel, expostos para venda pendurados em cordas ou cordéis, o que deu origem ao nome originado em Portugal, que tinha a tradição de pendurar folhetos em barbantes. No Nordeste do Brasil, o nome foi herdado (embora o povo chame esta manifestação de folheto), mas a tradição do barbante não perpetuou. Ou seja, o folheto brasileiro poderia ou não estar exposto em barbantes. São escritos em forma rimada e alguns poemas são ilustrados com xilogravuras, o mesmo estilo de gravura usado nas capas. As estrofes mais comuns são as de dez, oito ou seis versos. Os autores, ou cordelistas, recitam esses versos de forma melodiosa e cadenciada, acompanhados de viola, como também fazem leituras ou declamações muito empolgadas e animadas para conquistar os possíveis compradores.

Disponível em:



Usar a poesia para desenvolver a oralidade

Conheça um jeito lúdico e eficiente de expandir o universo de comunicação dos pequenos

Deborah Trevizan 
Foto: Fernanda Sá; agradecimento: Chicletaria e Imaginarte Empório Lúdico
Foto: Fernanda Sá; agradecimento: Chicletaria e Imaginarte Empório Lúdico
Desenvolver a oralidade é uma das habilidades que se espera nos primeiros anos de escolaridade. Nas turmas de pré-escola, é possível fazer isso de diversas formas. Brincadeiras cantadas, como músicas e cantigas de roda, ou faladas, como trava-línguas  e parlendas, sempre são bem recebidas nessa idade. De forma lúdica, elas ampliam as possibilidades de comunicação e expressão e promovem o interesse pelos vários gêneros orais e escritos. O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil prevê que os conteúdos ligados a essa área devem ser divididos em três blocos nas classes de 4 e 5 anos de idade: falar e escutar, práticas de leitura e práticas de escrita. Assim, num bom trabalho com esse tema a oralidade, a leitura e a escrita são apresentadas às crianças de forma integrada e complementar. O objetivo é potencializar os diferentes aspectos que cada uma dessas linguagens exige das crianças.


Hora de brincar com as palavras 
De acordo com a consultora pedagógica de NOVA ESCOLA e da Fundação Victor Civita, Regina Scarpa, levar turmas de pré-escola a desenvolver a oralidade é ampliar sensivelmente as possibilidades de comunicação. “O ideal é que o professor articule esse trabalho com tarefas de leitura e escrita, como o manuseio de livros, revistas e outros materiais, com o objetivo de criar o hábito e o apreço pela leitura e, com isso, despertar também o interesse pela escrita.” Entre os diversos gêneros textuais, a poesia se adapta muito bem a esse tipo de atividade. Na Escola Nossa Senhora do Morumbi, em São Paulo, isso já é realidade há mais de cinco anos (leia o quadro ao lado). E você também pode conduzir sua turma por esse caminho. O CD que vem encartado com esta edição especial, do cantor e compositor Gabriel o Pensador, traz quatro músicas e um poema, chamado Sandra e Pedro, que o próprio artista declama num vídeo gravado especialmente para NOVA ESCOLA On-line. Convide a criançada a acessar o site e ver as imagens antes de
colocar o CD para tocar. Outra forma de ampliar o universo discursivo é o reconto de histórias. Nesses momentos, os pequenos se apóiam em enredos conhecidos, criam diálogos e até mudam a voz para representar um personagem. 


Na Escola Nossa Senhora do Morumbi, em São Paulo, a professora Débora Corrêa ensina poesia para  turmas de 4 anos desde 2002. O projeto Poesia Também se Aprende tem por objetivo permitir que as crianças brinquem com as palavras e percebam as diferenças entre ritmos e sonoridades, cantar e recitar, falar e recitar. Após cinco anos de trabalho, ela diz que a garotada aprende a reconhecer, compreender e dar significado às palavras. “Sem falar que o vocabulário enriquece, pois todos aprendem novas expressões no contexto em que elas devem ser usadas”, afirma. “A poesia estimula o raciocínio ao brincar com as palavras. E os menores, que ainda têm dificuldade para se expressar, aproveitam muito essas oportunidades de troca, até porque os textos sempre representam situações reais.”

Ao longo do primeiro semestre, ela apresenta os textos para as crianças ampliarem o repertório. Todos os dias, na roda de conversa, alguns poemas são recitados em conjunto. A atividade começa com textos bem conhecidos. Pouco a pouco, o “cardápio” vai aumentando. Débora usa poesias curtas, de fácil memorização e com situações
próximas da realidade. Parte do trabalho é manusear os livros para garantir que todos reconheçam o nome da obra, do autor e do poema. “Essa foi uma idéia que surgiu durante o projeto, quando percebi que muitos ficavam extremamente interessados quando eu citava a obra e o poeta. Hoje, eles não só identificam os livros como também sabem até as páginas em que estão os versos prediletos.” Raridade, de José Paulo Paes (abaixo), está nessa categoria. O jogo de palavras, que faz com que “Arara” vire “Arrara”, num contexto que fala sobre a extinção dos animais, cativa a meninada. Já em A Boneca, de Olavo Bilac, as crianças se identificaram com o tema: a disputa pelos brinquedos. “Fiquei perplexa ao ouvir o grupo dizer, antes mesmo que eu terminasse de recitar, que não havia gostado da poesia. Quando perguntei por quê, eles disseram que era porque as meninas estavam brigando, mas, na verdade, eles se incomodaram com a situação retratada, não com o texto em si.”

Depois do mergulho no mundo da poesia, Débora montou um livro com as preferidas do grupo e cada um teve direito a um exemplar, ilustrado coletivamente. Além disso, pais, amigos e as próprias crianças gravaram uma fita cassete (com vários outros poemas não lidos em classe), o que favoreceu a memorização e possibilitou a ampliação do repertório, num trabalho que misturou oralidade e memória cultural. Para encerrar, a professora organizou um sarau de poesia, em que os pequenos declamaram os textos para familiares e funcionários da escola.

Raridade
 

JOSÉ PAULO PAES
A Arara
É uma ave rara
Pois o homem não pára
de ir ao mato caçá-la
para a pôr na sala
em cima de um poleiro
onde ela fica o dia inteiro
fazendo escarcéu
porque já não pode
voar pelo céu
E se o homem não pára
de caçar arara,
hoje uma ave rara,
ou a arara some
ou então muda seu nome
para arrara.


Disponível em: 

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